quarta-feira, 3 de março de 2010

VEM ESTIVILLIZAR... OU TALVEZ NÃO


Ontem assisti na RTP2 a uma entrevista do famoso pediatra neurofisiológico Eduard Estivill. Não o conhecia "pessoalmente" e engracei logo com aquele lado catalão de nos tratar à vontade, sem grandes deferências ou arrogâncias doutorais (nós continuamos dos países mais atrasados nisto de usar títulos catedráticos e profissionais como se estivéssemos nas cortes medievais). A minha introdução ao senhor Estivill foi relativamente recente. Pais preocupados com a dependência da Maria do carrinho de rua para adormecer e rejeição automática da cama caso não estivesse em sono profundo, recolhemos informação, lê-mos e decidimos aplicar o método Estivill para o sono.

Foi por isso que ontem ouvi deleitado os estudos e descobertas científicas que sustentam as medidas preconizadas no livro-método e que tanta celeuma levantam entre pais e mães e, ao que parece, alguns pediatras e outros especialistas. Estivill lá dizia ao entrevistador (que a certa altura assumiu uma postura de advogado do diabo, citando mesmo um testemunho recolhido na Internet de uma mãe "ofendida" pelo método) que não era "um pregador, um guru". Que apenas relatava os factos das suas descobertas, para quem os quisesse seguir.

Nós seguimos. E por muito que nos tenham custado os primeiros três ou quatro dias de braço de ferro com a Maria, estamos contentes por o termos feito. Hoje ela deita-se a horas certas - com um intervalo de tolerância que não torna a coisa demasiado rígida - directamente na cama e sem passar pela casa carrinho de rua ou colo de papá ou mamã (também vivemos esta fase de a adormecer ao colo...). Hoje ela dorme na sua cama e no seu quarto a noite inteira; quando acorda durante a noite, readormece sozinha a maior parte das vezes. Hoje ela é mais autónoma e auto-suficiente do que no passado. Os pais, malvados, já não a embalam horas ao colo até adormecer. Os malandros passam esse tempo a tratar da cozinha ou ver filmes. Os velhacos passam esse tempo em casal, ou nas suas coisas independentes. Enquanto isso ela dorme, sozinha, imersa sem transtorno alheio no reino dos seus sonhos. Como se estivesse num filme de Michel Gondry.

A mãe do testemunho, preciosa aliada do entrevistador (pareceu-me demasiado partidário, alguém confirma?), dizia que nunca deixaria a filha(o?) a chorar por uma questão de conveniência dela. E então, por essa razão, a criança dormia com a mãe. Eu, criança que dormiu no passado na cama da mãe, pergunto-me de quem será efectivamente a conveniência: de uma criança "inocente" que sente as coisas de uma forma só porque (ainda) não foi ensinada/acostumada de outra, ou de uma mãe desamparada a quem sabe bem o carinho e apego incondicional de um filho?

No meu caso, sobre os efeitos, basta-me dizer uma coisa: quem me dera terem-me ministrado o método Estivill...

P.S. - Independentemente disso, esta é daquelas revelações que um dia a Maria certamente nos irá questionar. Mas e então: ser pai e mãe não é aceitar o jogo de tentar ser o melhor possível, sabendo que nunca seremos perfeitos? Por isso, minha menina, volta lá para a tua cama no teu quartinho, se faz favor como os papás te ensinaram quando eras pequenina. Mas antes levas um beijinho e um abraço apertado.

2 comentários:

sofia vintém disse...

apanhei também o programa que já devia ter começado há algum tempo e constatei algumas coisas:
- que o entrevistador era mesmo faccioso. não percebi até que ponto não estava a tentar ironizar o que estava escrito no livro;
- que queria tanto voltar o tempo atrás e ter experimentado mais cedo com o vasco "as regras para adormecer", em vez de o habituar a ter-me na sua companhia até estar a dormir;
- que por muito que pareça não tenho alzheimer. afinal não chego é a ter tempo para chegar ao sono profundo que é necessário para fixar as memórias no meu cerebro :D

Paulo M. Morais disse...

eu acho que só podia estar a querer ironizar. ele falou do "instinto maternal dos animais que mantêm as crias perto delas" de "se para os animais é bom porque não para nós que também somos?" entre outros argumentos semelhantes que rejeitam toda e qualquer evolução científica.

nem era o caso de o homem querer vender mais livros, parece-me, mas sim de partilhar as descobertas que vai fazendo.

parece-me que este tema toca muito fundo nos pais: o medo de não darem amor e carinho suficiente aos filhos ou, quiçá, o próprio medo de não serem amados pelos filhos. vai daí, tudo o que seja considerado "frio" é rejeitado. digo eu, no fundo qui-sei-lá como diz a minha avó.