sexta-feira, 31 de julho de 2009

CRIANCICE PATENTEADA #5:
CAPACHINHO MENOR DE IDADE



Problema: ainda não consegui ridicularizar o meu filho como deve ser.
Solução: perucas para crianças.
Slogan: “No baby, no cry” [peruca rasta à Bob Marley]
Justificação: “A Baby Toupee tem como missão mostrar que se a parentalidade pode representar uma grande responsabilidade, também pode ser uma fonte de diversão sem fim.”
Efeito colateral: todos e mais alguns que se possa pensar; um dos piores serão os processos judiciais movidos pelos filhos, depois de crescerem e entenderem a humilhação a que foram sujeitos.
Aviso: eu cá por mim, pensava duas vezes em registar a gracinha em vídeo ou fotografia...

quinta-feira, 30 de julho de 2009

NOVE MESES, CINCO OBJECTOS



A Maria cumpre nove meses. Para assinalar a data, aqui estão cinco objectos de que ela gosta especialmente. É provável que a lista pudesse apresentar ligeiras diferenças na semana passado ou na que ainda está por vir. Mas estes objectos não deixariam de ter uma resistência especial.

FRONHA, melhor conhecida pelo Ó-Ó
O ó-ó é o companheiro inseparável da Maria. Seja para dormir na cama ou acalmar no carrinho, ele tem de estar presente. Quando entra em cena, dado para uma das mãos ou colocado (às vezes até atirado) em cima da cara, tem um efeito imediato no serenar do choro. Está umbilicalmente associado ao dedo na boca (a Maria rapidamente rejeitou a chucha para nosso desprazer). Faz lembrar a fralda que o Linus do Charlie Brown carrega para todo o lado.

CARRINHO DE BEBÉ
É um objecto todo-o-terreno. Não só serve para os passeios no jardim e afins como é o local preferido para o descanso após o desgaste dos dias passados na escola. Actualmente, a Maria já dá o jeitinho necessário aos braços para colocar ou retirar os cintos. E encontrou utilidade no varão de segurança para pousar os pés ou as pernas. Gosta de adormecer numa espécie de ninho, com a capota posta. O papá especializou-se em empurrar o carrinho com o pé, enquanto sentado no sofá a ver séries ou filmes.

URSINHA DADA
Da dúzia de bonecos e brinquedos à disposição da Maria, a ursinha Dada acabou por ganhar um papel de relevância. É a companheira ideal para os momentos de contemplação no carrinho, seja de manhã enquanto o papá ou a mamã se aprontam, seja de tarde enquanto espera pela chegada da sesta pré-banho. Conversam bastante as duas, provavelmente sobre as parvoíces parentais. Ao contrário do que acontece com outros bonecos, a ursinha é quase sempre tratada com gentileza.

COPINHOS COLORIDOS
Proveniente da prima de Peniche, o conjunto de copinhos coloridos que se encaixam como matrioscas constitui a principal diversão à hora da refeição. A Maria aborda o tema através das variações bater-com-o-copinho-no-tampo-da-cadeirinha, bater-com-um-copinho-no-outro, e a clássica deitar-o-copinho-para-o-chão. No banho, a presença dos copos também é imprescindível, sendo o molhar-a-mamã uma das actividades favoritas. Recentemente adquirimos outro conjunto de copinhos, com rebordos “mastigáveis”, que vieram acrescentar uma nova brincadeira: a construção pelos pais de um arranha-céus de copinhos que a Maria “King Kong” se apresta a derrubar. Tenho a impressão que depois vai ser mais difícil ensiná-la a construir...

FLOR
É um objecto que acompanha a Maria desde o nascimento e que continua a ter utilidade. Escondida no cestinho que contém as fraldas, os cremes, os soros e restantes et cetera, a flor é elemento apaziguador durante a tarefa do vestir ou trocar fralda. A ocasião é um suplício para a Maria que se irrita por ter de estar deitada. E, se bem que a quantidade de tempo de distracção proporcionado varie de dia para dia, o malmequer macio e sorridente continua a ser o primeiro truque da lista. Por vezes, desde que não haja engano e coloquemos a tocar a música dos parabéns com que a Maria sempre embirrou, dá conta do recado sozinho. Doutro modo, é preciso passar à forma de distracção seguinte que tanto pode ser a escova do cabelo, o babete, as peças de roupa a vestir, o sapo voador, o polícia sinaleiro, o pai dançarino... ufa... ó filha, voltamos à flor que é tão bonitinha?

terça-feira, 28 de julho de 2009

CANTILENAS DE DORMIR


Nos primeiros meses da Maria, houve duas cantilenas que utilizámos com abundância para a serenar e adormecer. Diga-se que umas vezes com mais sucesso do que outras. Eu recorri a uma recordação de infância, com as devidas adaptações. A minha avó cantava-me assim:

Ó Niquinho vai-te embora
Sai de cima do telhado
Deixa o Paulinho fazer
Um soninho descansado

Niquinho era a abreviatura do meu gato preto Niki. Como agora não há felinos cá em casa – à excepção do miar fingido da mãe e do pai – a nova versão recorre ao generalista gatinho. De vez em quando, talvez por um saudosismo subconsciente, saia-me um “Vai para cima do telhado”, o que significaria que o gatinho andava cá por casa. No remix 2009 também não há lugar ao diminutivo no nome. Já me basta a luta acesa que tenho contra o “coitadinha” que de vez em quando surge. Coitadinha porquê? Curiosamente, descobri depois um CD em que a Sara Tavares canta “Vai-te embora ó papão / Do alto desse telhado / Deixa dormir a Matita / Um soninho descansado”.
A outra canção a que recorremos veio da tia Tita. Nunca a conseguimos decorar de forma correcta e parece-me que a Maria acabou por ouvir, pelo menos por parte do pai, uma versão alternativa:

Um peixinho, vermelhinho
Nada, dança, no laguinho
Sobe e desce, sem parar
Para ver alguém chegar

Não tem medo, o peixinho
Porque sabe o seu segredo
Que no fundo do laguinho
Ele é sempre um peixinho

Que no fundo do laguinho
Ele é sempre um peixinho

Da experiência acumulada, acabei por utilizar o Peixinho para acalmar e o Gatinho para adormecer. Mesmo com o risco de um comer o outro, confesso que houve vezes em que as intercalei. Mas mesmo hoje em dia, não há nada como o Breathless do Nick Cave para acabar com o choro e meter um sorriso na Maria. E pergunto-me se isso não terá a ver com termos assistido ao concerto do homem com a bebé ainda na barriga da mãe.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

ENTRE O CÉU E O PURGATÓRIO


E depois da saída da Maria foi só felicidade. Ou quase. As horas do pós-parto tiveram tudo para se tornarem traumáticas. Porque há uma placenta teimosa que se fragmenta e obriga a mãe a continuar amarrada a uma cama, com ocitocina para expelir os restos indesejados. Porque se acumulam dores e cansaço extremos à necessidade de começar a cuidar de uma bebé. Porque acrescem as dificuldades da alimentação e a Maria só consegue pegar inconsistentemente numa mama. Porque a visão da mãe torna-se turva, desfocada, duplicada e nota-se uma fraqueza geral de viver apenas à custa de soro desde há 20 horas seguidas.
Surge uma sofreguidão de ver tudo resolvido. Sinto-me impotente para ajudar a aliviar o sofrimento alheio. Depois de um esforço tão grande, não era esta a medalha de desconsolo que a Andreia merecia. As intervenções médicas posteriores provocam dores maiores do que as do parto. Novamente posto do lado de fora do quarto, desta vez não posso sequer estar perto para apertar uma mão e relembrar para que respire com calma. Resta-me regressar para ao pé de mãe e filha após uma sessão de “tratamento”. Tento serená-las. Ao fim de algum tempo, a Maria acalma o choro e adormece ao meu colo pela primeira vez. E a Andreia também consegue, finalmente, dormitar um pouco. Coloco a bebé no berço e deixo-me cair na poltrona. Entre o cansaço rasga-se um sorriso à força. Fecho as pálpebras, imerso na gloriosa sensação de ter auxiliado as minhas meninas a adormecer. Há raras alturas em que nos sentimos realmente úteis.
Quando acordo nada mudou. A Andreia permanece na sala do recobro, a Maria continua a ter dificuldade de mamar. Espera-se ainda por uma cama vaga na ala de internamento. Regresso a casa quase 24 horas depois de ter saído. No hospital, a Andreia suporta sozinha uma noite sofrida, com mudanças de cama, dificuldades em alimentar a Maria, um médico muito conceituado que utiliza um humor desfasado.

- Então quantas pessoas está a ver? – pergunta de chofre logo após entrar na sala.
- Desculpe? – responde uma mãe atarantada por uma montanha-russa de emoções e fragilizada pelos eventos subsequentes ao parto.
- Sim, quantas pessoas está a ver? – repete o médico.
- Não estou a perceber, senhor doutor.
- Então não é a senhora que se queixa de ver a dobrar?

Na noite seguinte, será o mesmo médico a achar indevida a intervenção médica programada. Estava a escassos minutos de acabar o turno. Em jejum, a Andreia regressa para junto da Maria. O médico regressa a casa ou, quiçá, às consultas de madrugada no consultório privado. De manhã, colegas torcem o nariz à não realização da curetagem e levam a sério a questão óptica, enviando a Andreia para testes noutro hospital. Nesse princípio de tarde fico pela primeira vez “sozinho” com a Maria, num quarto de hospital público com vista para o Cristo Rei. Ela tem dois dias de vida.
Despistado e minorado o problema da visão, deixada a questão "placentária" ao cuidado da natureza (sem curetagem ou medicamento, portanto), chegará tempo de finalmente rumarmos os três a casa. Na nossa primeira semana de parentalidade, entendemos o que é um apoio solidário de avó. Agradecemos com sorrisos sempre que possível. E com o colocar-lhe no colo uma bebé que nos ensina, verdadeiramente, o que é amar.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

CRIANCICE PATENTEADA #4:
BIBERÃO EXPRESSO


Problema: Incapacidade crónica de preparar um biberão de leite.
Solução: máquina de Leite Expresso
Curiosidade: a máquina dispensa e mistura a quantidade desejada de leite em pó e água, à temperatura pretendida, despejando o resultado para o biberão; também ferve água e arrefece até uma temperatura bebível e esteriliza biberões.
Lacuna: falta o controle remoto, já agora.
Efeito colateral: Incapacidade crónica de preparar um biberão de leite.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

NAMORICO PRECOCE

Eu sabia que devia ter logo posto cobro à situação. Agora estou tramado. Saio com a Maria de manhã e pronto, está a tenda armada. A porteira com o João ao colo a dizer para as vizinhas que passam (o átrio de entrada do nosso prédio é uma espécie de ponto de encontro): “Ai, haviam de os ver ontem a bater palminhas um para o outro! Bate lá palminhas João, bate lá!”. O miúdo hoje estava com a telha e não bateu palmas. Aproveitei logo para olhar para a Maria ao estilo “estás a ver como é que ele é, filha?”.
O pior é que uma vizinha de prédio anexo já se aprestava a ditar sentenças: “Então João já tens namorada? Escolheste bem!”. Urge rectificar a senhora. Um: não há namoro nenhum (amanhã levo a Maria vendada para isto tudo acalmar). Dois: tenho cá a impressão que a Maria é que faz as escolhas.
No meio disto tudo salvam-se os pais do rapaz, sempre simpáticos e nada incentivadores deste tipo de pré-arranjos matrimoniais. No fundo, acho que eles já entenderam que se calhar arranjam para o João melhor... sogro.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

RECEITA DE GELADO AMBRÓSIO


À cabeça das provações a suportar pelo homem durante uma gravidez, estão os famosos caprichos de "apetece-me algo". A frase tem o condão de transformar um banal futuro papá num Ambrósio explorador à procura do gelado inexistente. As grávidas, por estarem no seu estado de excepção, têm a impressão de que as arcas congeladoras têm um compartimento secreto com os gelados que pretendem, por mais mirabolantes que sejam. Devo ressalvar que tive sorte neste capítulo e as parcas solicitações que recebi foram todas fáceis de cumprir. Mas sei de quem não tenha tanta sorte.
Deixo por isso aqui um conselho prático para os futuros papás. Quando vos exigirem de madrugada um “corneto de manga, morango e chocolate”, não se ponham à procura dele em todas lojas de gasolineiras da zona. Vão sempre ser alvo da troça do pessoal que está na caixa, demasiado habituado a ouvir os pedidos mais absurdos de maridos desesperados. Em vez de saírem numa correria desenfreada, tentem fazer ver que o gelado requisitado não existe e peçam uma alternativa. Preparem-se no entanto para uma possível insistência por parte da grávida: "Mas é esse que me apetece: morango, maaangaaaa e CHO-CO-LA-TE!!!". Nestes casos extremos, respirem fundo e tenham calma. Também nós temos um manual de sobrevivência. Aqui fica a receita.

GELADO AMBRÓSIO

1 - Comprar caixas separadas de gelado com os sabores pretendidos pela grávida;
2 - Comprar um gelado de cone;
3 - Retirar o recheio do gelado de cone (comam o recheio para repor os níveis energéticos);
4 - Inserir bolas dos gelados solicitados no cone vazio;
5 - Se forem perfeccionistas e os níveis de irritabilidade da mãe estiverem baixos, colar um papel sobre o rótulo original a dizer "Gelado de morango, maaaaaaaaaaaaaanga e CHO-CO-LA-TE!!!".
6 – Servir imediatamente e com um sorriso (não demasiado irónico para não levarem com o gelado na cara).

terça-feira, 21 de julho de 2009

CUIDADINHO COM AS CONFIANÇAS...

Acho que já devo ter referido que a porteira do nosso prédio faz questão de acasalar a Maria com o miúdo do nono andar. Eu resisto todos os dias ao compromisso (sempre que desço com a Maria para a levar ao berçário, o miúdo está lá com a porteira que faz de baby-sitter) e digo que ela é que há-de determinar e que pretendentes não lhe faltam. Quando eu quiser acabar de vez com o assunto, pergunto à senhora como é que ela sabe que a Maria não vai ser lésbica? Mas nesse dia, não só acabo com o assunto como certamente também com toda a simpatia dela, pelo que ainda não recorri a esta estratégia desesperada.
Hoje a cena repetiu-se. Saímos do elevador e lá está ele ao colo da porteira. O puto já cumpriu um ano e tem cara de reguila. Hoje está com cara de amuo. Exponho a Maria aos “Olha a princesa! Que linda!” acompanhados dos “Olha aqui o João!” e ele comporta-se com dignidade, sem esboçar um sorriso. De repente, o miúdo arreganha a boca, mostra a dentição avançada, sorri para a Maria e começa a bater palmas. A porteira dá pulos de alegria mas eu fico impávido. Demora dois segundos até a Maria retribuir as palminhas. E ficam os dois nisto durante uns segundos. Tento escapulir-me enquanto a senhora com o miúdo ao colo recupera do orgasmo de felicidade pelo entendimento entre bebés acabado de testemunhar.
Lá fora, aviso a Maria para ter cuidado com estes gabirus mais velhos. E amanhã acho que vou agarrar nela de forma a que não consiga bater palminhas e encorajar os avanços do João. É que se isto prossegue, para a semana a porteira já marcou a data do casamento.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

PARTO FELICIDADE


O jogo da Playstation está parado mas subsiste a dúvida sobre se devemos ir já para o hospital. Aparentemente a bolsa amniótica rompeu, mas as contracções ainda não se faziam sentir. Telefonamos para uma linha de apoio onde a enfermeira de serviço (a que nos ministrara o curso de preparação para o parto) aconselha a rumarmos ao hospital. É preciso monitorar possíveis infecções. Actuamos sem stresse. Há tempo para a grávida tomar um duche rápido, colocar desodorizante (afinal de contas num parto deve suar-se bastante), ver se o esquentador fica desligado.
Ao sair e fechar a porta de casa estávamos a dar entrada num mundo diferente, sem nos apercebermos bem da dimensão do passo. A admissão nas urgências do São Francisco Xavier é faseada. Primeiro a mãe, vá-se lá compreender porquê. O pai espera cá fora, ainda acompanhado pelo amigo-motorista-companheiro de PES. Digo-lhe que estou bem, que vá descansar para casa. O dia seguinte será de trabalho, para quem não for pai nessa noite.
Passados minutos chamam a AV pelo altifalante. Intrigado, meto a cabeça entre as portas vai-e-vem da urgência e espreito. Vejo um homem vestido de bata azul e uma mulher de bata amarela.

- Chamaram por uma Andreia? – pergunto com um ar meio surpreso.
- Ela está aí fora? – inquere o enfermeiro.
- Er... não... entrou para aqui faz 15 minutos...

Mau, querem ver que eles perderam uma futura mamã? Fico ali especado à espera de que apareça o Sherlock Holmes para solucionar o caso mas afinal não é preciso. Lá descobrem que a malvada tinha ido à casa-de-banho. Não se pode confiar nas grávidas, estão sempre a mudar de sítio.
Finalmente permitem-me entrar. Dão-me coordenadas até ao quarto da AV mas bem que poderiam entregar um GPS que seria mais fácil. O primeiro percurso, já se sabe, é sempre o mais difícil e longo. Mais tarde, ainda hei-de percorrer vezes sem conta este mesmo trajecto quase de olhos fechados.
A AV está deitada na marquesa com o soro a invadir-lhe as veias. Reparo no espaço amplo e desafogado, nas luzes suaves, na poltrona reclinável à espera do pai. Penso que é um quarto mais simpático do que muitos daqueles em que estivemos durante a nossa volta ao mundo. E concluo que é um excelente sítio para dar a volta à nossa vida.
As contracções estão espaçadas e os dedos de dilatação ainda distantes do necessário. Temos o nosso plano de parto na ponta da língua. A AV vai comunicando com o enfermeiro que volta e meia aparece para controlar os sinais do CTG. Os minutos da madrugada esticam e a certa altura é preciso permitir a introdução da ocitocina para acelerar o processo. As dores aumentam e é difícil dormitar. Acedemos a que nos seja explicado o procedimento e consequências da epidural. Percebemos pela primeira vez que haverá controlo dos membros inferiores durante o parto. Saio para que efectuem a técnica.
A epidural demora a fazer efeito. Passam 45 minutos e a dor permanece. A anestesiologista de serviço está ocupada noutro caso, é necessário aguardarmos que regresse para rectificar a dosagem. Apesar do esforço heróico da AV, as dores intensificam-se e carregamos timidamente no botão para chamar alguém. Surge a enfermeira Felicidade. Assenta-lhe bem o nome. É a ternura em carne e osso. Analisa a AV e percebe que a dilatação foi mais rápida do que o esperado. Está tudo pronto. Faz-lhe uma festa na testa enquanto lhe diz coisas carinhosas. Apetece-me abraçar a senhora, naquele momento irrepetível. Ela chama as colegas que nos vão colocar a Maria nos braços.
Calha-nos a versão feminina e hospitalar da A-Team. As três enfermeiras perfumam o quarto de boa disposição. Pergunto o porquê de se chamarem Equipa A? Dizem-me que é por serem a equipa do Amor, Alegria e Amizade. E ali leram a sina da Maria, mesmo antes de ela saltar cá para fora. Começou por parecer preguiçosa a moça. A AV recebia incentivos e elogios de todo o lado – “Assim mesmo! Força! Lá em baixo, isso! Boa!” – mas nada de Maria cá fora. O tempo passa e a Equipa A resolve chamar o médico de serviço. Surge um homem de cabelo encaracolado e ar bonacheirão, acompanhado de mais um obstetra e dois jovens internos. Toma conta da ocorrência e pede para o pai sair por um momento. Do lado de fora, porta fechada, os segundos eternizam-se. Envelheci séculos até me mandarem reentrar.
Rejuvenesço assim que vejo as mãos do obstetra-parideiro a retirarem a Maria para este mundo exterior. O sangue, desta vez, não me incomoda. Sou novamente uma criança quando a ouço chorar pela primeira vez. E quase deixo de ter existência física quando pousam a Maria ao colo da mãe. Apetece-me abraçar toda a gente mas já só consigo fixar, entre uma ou outra lágrima, uns olhinhos pequeninos fechados junto ao peito de uma mãe de olhos exaustos mas imensamente felizes.
O médico de cabelos encaracolados divide o tempo entre assegurar-se que tanto mãe como bebé estão bem. Exibe um sorriso glorioso por ter contribuído para trazer mais uma vida, enquanto o colega cose a ex-grávida. Explica todos os quês e porquês. A Maria não saia por ter o cordão em volta do pescoço. Houve necessidade de ventosa e “impunha-se” realizar cortes para auxiliar a saída. E já fora do centro nevrálgico das urgências, o médico ainda gasta um pouco do precioso tempo para dar explicações ao tio da Maria e dar-lhe os parabéns pelo óptimo comportamento dos pais.
No quarto, o espaço amplo concentra-se no corpo de um ser com menos de meio metro, nascido às 12 horas e 25 minutos. E somos três que lá cabemos, num abraço comum que contém em simultâneo todas as palavras belas que existem e as que estão por ser inventadas.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

CRIANCICE PATENTEADA #3:
MORDES OU NÃO MORDES?


Problema: O raça do miúdo não mastiga bem a comida.
Solução: Contador electrónico de dentadas
Curiosidade: o sensor Kami-Kami emite som a cada 30 dentadas.
Efeito colateral: desgaste do esmalte dentário após várias corridas de 180 dentadas em menos de 30 segundos.

ESPIÕES NO BLOGUE


Ontem deitei-me desconfiado de que a Maria tem um espião qualquer a informá-la sobre o que se passa neste blogue. É que mal abordo aqui um assunto de forma positiva, ela apressa-se a mostrar que nem sempre é assim. “Olhe que não, olhe que não”, diz ela de soslaio. Vejamos. Fez birra para dormitar antes do jantar. Fez birra para comer a sopa e deixou quase tudo (só conseguimos enfiar a papaia pela goela abaixo). E à meia-noite estava com um ataque de energia tal que, de tanto agitar os braços, parecia um coelhinho-tambor com pilhas novas.
Foi parar ao chão da sala para gastar a bateria com os brinquedos. Lá se cansou e foi para o carrinho, até adormecer embalada pelo movimento para a frente e para trás e a sonoridade dos concertos de Brandeburgo do Bach que o pai já deita pelos ouvidos (mas tem sido o que resulta melhor). Era uma da manhã e ela dormia com um sorriso malicioso que parecia significar “Com que então noites santas, hein?”. E isto tudo ainda sem gatinhar ou andar...
Por isso... hoje não vou dizer nada de bom sobre a Maria. Assim pode ser que à noite seja o mesmo anjinho que foi hoje de manhã. Er... anjinho, não, enganei-me, uma verdadeira pestinha que acordou sorridente, bebeu o leite todo, brincou com os fumos do vaporizador, não refilou demasiado com a sempre desgastante troca de fralda e de roupa, e entrou para o elevador a palrar ao ritmo do assobio do pai. Um autêntico desastre, filha!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

PALMAS DESARMANTES


Parecia não haver nada de novo hoje de manhã, enquanto a astronauta-bebé atestava o depósito de leite. Esparramada ao longo do colo, concentrava o olhar no cumprimento da tarefa. Já quase no final do biberão, afasta-o com uma mão, olha para o astronauta-pai a sorrir e começa a bater palminhas.
Ora este gesto é o que os pais arranjaram para determinar o final bem sucedido de uma refeição. "Comeste tudo? Então recebes uma salva de palmas." Mas hoje foi ela que determinou o final. E enquanto eu digeria a perplexidade, com o biberão na mão direita, e tentava perceber o que fazer, a Maria "pede" para endireitar as costas e... arrota. O burp silenciou os meus pensamentos. A Maria determinara, para além de qualquer argumentação possível, que já bebera o suficiente.
Analisei os 20 mililitros de leite restante e senti a minha fraqueza perante um ser tão determinado. Por isso vou dedicar o resto da tarde a ler uns livros de auto-ajuda para fortalecimento do ego e da autoridade. E amanhã, para evitar humilhações, vou mas é meter menos 20 mililitros de combustível no biberão!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

NOITES SANTAS

Na fila do supermercado, vindo de alguém atrás de mim.
- Então, vou precisar de te bater para passar à frente?
Calma, eu conheço-o.
- Tudo bem? Como vai isso?
Conversa disto e daquilo, como estás, o que fazes...
- E a tua filha, como vai?
- Tudo óptimo, uma tosse aqui, outra acolá.
- E deixa-vos dormir?
Explico que a Maria, por enquanto, vem com o chip correcto. Adormece por volta das 22 ou 23 e só acorda no dia seguinte, geralmente por volta das oito da manhã.
- Ah, mas isso pode mudar a qualquer momento.
Sempre que digo que a Maria geralmente dorme bem, recebo como resposta habitual um “Que sorte!!!”, num tom onde até pode constar uma certa inveja. Desta vez fico esclarecido que o estado de graça pode esfumar-se de um momento para o outro. Agradeço a atenção.
Se calhar, em vez de dizer que dorme a noite toda bem, vou mudar de estratégia.
- Uma chatice. Pelo menos levantamo-nos de noite entre uma a três vezes, com ela a tossir, ou com a chorar com um pesadelo ou para ver se, como sempre, se atravessou na cama destapando o corpo.
No fundo, nada disto é mentira. É apenas uma questão de... prisma de visão?

terça-feira, 14 de julho de 2009

COF COF COF

A Maria está sempre a tentar adicionar onomatopeias ao seu léxico de bebé. Desde há uns dias que anda a dizer que tem tosse, através de um inconfundível "cof cof cof". Por vezes fico na dúvida de se não anda a proferir uma versão mais inglesada, ao estilo "cough cough cough". O certo é que tem os brônquios cheios de porcaria e, consequentemente, tosse. Na escolinha é o pânico (por causa da tal gripe, sim). Em casa é a tentativa de minorar o desconforto dela. No pediatra é a (necessária e bem-vinda) resposta calma: muito soro e vapores três vezes ao dia. Quanto à tosse... "se tem tosse, tussa!", já bem dizia a minha avó materna. A tosse em si mesma não representa nada de mal.
A Maria, como sempre, é a mais lúcida. Continua a desfrutar os tempos partilhados com a família e amigos (teve um fim de semana cheio de avós e bisavós e tios e amigos dos pais) e anda a aprender um novo movimento bascular para mostrar que está contente. São os pinotes: ao colo, sentada no chão ou até deitada na cama. Mesmo com cof cough pelo meio, a Maria "Pinotes" consegue mostrar um ar de felicidade.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

MANOBRAR COM REGRAS

Nas contas de motivos para vingança quando crescer, a Maria já tem uma folha rascunhada em relação ao papá. Assim por alto, inclui pelo menos três blusinhas vestidas ao contrário (“oh filha, mas os botões também ficavam muito bem para trás!”) e um esquecimento de creme no rabinho (“mas foi limpo, foi limpo!”). Mas o que mais incomoda a pequena vampirazinha são os ataques solares de que é alvo.
Não há pior do que ela ir a passear no carrinho, à sombra dos prédios, e de repente ser incomodada por um raio solar, ao atravessar a rua, porque o pai não teve tempo de puxar a capota a tempo. Depois de se mostrar incomodada, mete o olhar fulminante número quatro e até me parece que surgem dois caninos salientes no lugar dos dentes que ainda não tem.
Falhei e ela está pronta para me morder (só com as gengivas, felizmente). Concluo que é melhor passar o comando do carrinho para a mãe. A mudança tem efeitos colaterais, como paragens em frente de montras que só devem servir para estimular o consumismo do bebé. Enquanto espero a cinco metros de distância para não ser contaminado pelo vírus da loja, percebo que junto às instruções de operação dos carrinhos devia passar a vir um Código da Estrada para a Condução de Carrinhos de Bebé. Pela minha parte, o código Maria teria de incluir estas regras.

1 – Evitar choques luminosos sol/sombra no caso de filhos vampirescos
2 – Proibido parar o carrinho de frente para montras de lojas
3 – Saber destrinçar rapidamente quando fugir das velhinhas que se aproximam a dizer “Que lindo bebé!” (só porque está vestido de azul), pretexto para depois ficarem a conversar meia hora sobre os filhos crescidos que têm.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

AFINAL, QUE ANIMAL SOU EU?

A primeira votação do blogue-pai foi um sucesso. Dois dos três leitores assíduos votaram no inquérito realizado. Só tenho dúvidas em relação à identidade de um dos votos, já que o outro foi meu. Mas desconfio que tenha sido a Maria. Quase que apetece colocar outra votação no ar, com base nesta primeira votação.

Que razões pensa terem levado a que só duas pessoas votassem?

a) utilização de linguagem demasiado informal
b) aaaah, era para votar?
c) o segredo de justiça
d) não dava direito a brindes
e) os pais, familiares, amigos, não brincam com as crianças
f) o inquérito não está num site "na moda"
g) medo de que o Agridoce comentasse o voto

Parece-me que esta sondagem conseguiria bater o recorde e só ter uma resposta. É que eu ia ter de me abster! :-)

Em relação aos resultados, nota-se um empate. Os animais que mais se imitam para as crianças são os galináceos e os cães, cada qual com um voto. Melhor dizendo: 50% de galináceos e 50% de cães! São percentagens muito significativas, não acham?!? O pior é que se foi mesmo a Maria a votar, talvez seja obrigado a anular a votação por erro técnico. Ora bolas!

CRIANCICE PATENTEADA #2:
PROBLEMAS EM LEVANTAR (VOO)


Problema: Manifesta inépcia no lançamento de aviões de papel.
Solução: Lançador eléctrico de aviões de papel.
Efeito colateral: Projéctil pode atingir os 50 km/h. Bye-bye avião, olá processo em tribunal por ter-se despenhado no olho de um transeunte.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

JOGO INTERRUPTUS


Já passava da meia-noite. Lá fora fazia frio mas dentro da sala estava um calor abrasivo. Um jogo fantástico, a transbordar de golos, a culminar uma eliminatória memorável. Eu agarrado a um comando, o Heitor agarrado a outro. Sorrisos, urros e esgares para o que se passava no ecrã. A nossa tradicional simulação PES – para as leigas trata-se de um videojogo de futebol para a PlayStation – da Liga dos Campeões vivia um dos momentos mais altos da já longa história.
A porta da sala estava fechada e nós abafávamos a emotividade ao máximo possível. Tarefa difícil. Estava a ser um daqueles jogos em que apetecia mandarmo-nos para o chão por causa de um golo falhado ou marcado. Mas a alguns metros de distância, na cama do meu quarto, dormia uma grávida.
A meio da segunda parte, entre suores e frases ao estilo “que granda jogão... incrível!!!!!”, chamam-me do corredor. Como grande profissional PES, obviamente esperei pela confirmação do apelo antes de largar o comando. Ele veio novamente e lá carreguei na temível tecla “pause”. Aos 73 minutos de jogo saí do estádio e dirigi-me à casa de banho. Encontrei uma grávida de 39 semanas com a impressão de lhe terem rebentado as águas. Pensei nas possibilidades de aplicar um penso, ou meter uma rolha, qualquer coisa que vedasse as tais águas por mais alguns minutos. Mas perante o ar de relativa preocupação da mãe, achei melhor não lhe comunicar as propostas.
Em vez disso fiquei ali mais uns instantes a confirmar que era mesmo verdade. Que a Maria me estava a interromper um jogaço da Liga PES. Depois regressei ao estádio.

- Parece que vamos ter de adiar o fim do jogo. A Maria está a caminho.

Aguardei expectante por uma súplica do outro lado, à laia de “e achas que não dá para acabar?”, mas o Heitor já estava a levantar-se para se ir calçar e nos levar ao hospital. Raça do homem e a sua dedicação mal direccionada! Então não era mais importante terminar o jogo?!?
Reunimos calmamente o material necessário para a ocasião e lá partimos os três (ou os quatro), noite dentro, por uma estrada quase vazia até ao hospital. Esperançoso, deixara a consola ligada, sustida naquele odioso momento de pausa, para retomar o prélio assim que possível.
Quando regressei a casa, quase 24 horas depois, deitei-me no sofá para descansar da montanha-russa em que andara. Notei a luzinha verde na consola e lembrei-me do jogo inacabado. A memória contrapôs-me o bebé e a mãe que deixara no hospital. Pouco depois adormeci.
Na manhã seguinte, antes de rumar ao encontro da recém nascida e ex-grávida, desliguei a consola. Acho que os jogadores virtuais ainda não me perdoaram. Mas quando a Maria foi maiorzinha, deixem estar que eu apresento-lhes a verdadeira culpada.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

CLAP CLAP CLAP

Palminhas quando vê os pais. Palminhas quando a tiram na cama. Palminhas quando acaba de comer. Palminhas quando lhe pedem palminhas. Palminhas espontâneas sem razão. A Maria aprendeu a bater palminhas. Mais do que isso, a Maria aprendeu a chamar a atenção através de palminhas. E está a perceber que assim tem mais sucesso dessa forma do que com o choro.
Mas há sempre um mas. Então e não é que passou por cima da fase do “põe, põe a galinha o ovo...”? Eu cá por mim, estou com enorme dificuldade em saber como é que vou suportar esta lacuna evolutiva... Ó filha, os papás não mereciam!

terça-feira, 7 de julho de 2009

UM DESACORDO TODO PIPI


Não consigo entender como é que anda tudo tão preocupado com o acordo ortográfico da língua portuguesa quando ainda subsiste um problema gravíssimo no domínio da linguagem pais-filhos. Qual? Como é que vamos chamar à... chamar a... chamar ao... chamar àquilo!
Na família AV, o sexo da menina é oficialmente a “Lóló”. Eu não engraço com o termo. “Vamos lavar a lóló” parece-me qualquer coisa como ir ajudar uma avó velhinha a tomar banho. Ou recorda-me um ló do pão-de-ló mas com eco.
Não seja por isso: a secção da família maternal da Maria é rica em alternativas. Mas “Flor” não melhora em nada o panorama, até pode criar confusões na criança ao ouvir mais tarde “essa flor já está a cheirar mal” ou “ai que flor linda!”. Quanto a “Papeleca”, é um autêntico mistério sobre origem e significado. Mais uma vez, noto uma certa desadequação: “Anda tratar da papeleca” parece mais uma indicação para um escriturário ou contabilista do que para uma menina. Finalmente, espaço ainda para o fantástico “Bechaninha”, assim dito com “e” em vez de “i”. Só posso crer que este termo é o aportuguesamento não premeditado de “pussy”. Ainda assim, “lavar a bechana” parece-me mais indicado para significar “ir dar banho ao gato”.
Do lado paternal da Maria a situação ainda é pior. Há uma verdadeira omissão de expressões, um vazio ritual por preencher. Perguntei à minha avó como se referia à dita cuja enquanto criava as filhas e ela respondeu que nunca teve necessidade de mencionar especificamente esse local geográfico das meninas. E quando teve, utilizou um dá-pró-menino-e-prá-menina: “o Xixi”. Ora, não me parece que vá dar bom resultado mandar a Maria “lavar o xixi”.
A questão não é para rir. Isto é muito grave e custa-me que os senhores catedráticos não se debrucem sobre a questão. Eu ainda tentei impor um novo termo cá em casa, mas “Gina” (ou o diminutivo “Gininha”) não gerou simpatias, vá-se lá entender porquê. Cá por mim, tudo me parece melhor do que acontecer o mesmo que à mãe da Maria. Durante anos e anos, a AV pensou que era diferente das outras meninas: é que ela tinha uma “Lóló” em vez do muito comum “Pipi”.
Acontece que também não estou contente com a generalização do pipi. É que a palavra é demasiado oferecida. Segundo o dicionário, tanto significa o “pénis de criança” como as “partes pudendas das crianças do sexo feminino”. Além disso, serve de alternativa ao “fazer xixi”. Mas ainda há pior. Analisemos dois problemas por que uma criança pode passar caso aprenda que o pipi é o sexo dela.

Pergunta: “Onde está o pipi?”
Resposta da criança: tendência a indicar o meio das pernas
Real significado da pergunta: “Para onde foi o pintainho?”

Pergunta: “Vais todo pipi!”
Resposta da criança: tendência para ver se tem a braguilha aberta
Real significado da pergunta: “Estás muito elegante!”

Já para não falar de que, quando aprenderem a ler, as crianças vão saber que em qualquer tasca portuguesa também “há pipis”. Ou se por acaso alguém da televisão pensar em repor a Pipi das Meias Altas. Estão a imaginar a confusão que isto pode gerar? Na verdade, há demasiados pipis para que o termo possa ser utilizado como oficial para representar a coisa da menina e do menino. O lado masculino, por mim, ficava já arrematado na “pilinha”, que não dá azo a confusões (excepto aquela típica da matemática). Mas e para a menina? Como chamar àquilo, hum?

segunda-feira, 6 de julho de 2009

CRESCIMENTO LEGO


Acompanhar o desenvolvimento de um bebé é um pouco como brincar ao Lego. De repente, lá está mais uma peça adicionada, quase de forma automática (ninguém pensa propriamente como é que as peças encaixam, é algo já mecânico), na construção da casa-criança.
Infelizmente, a maior parte das vezes os pais não têm tempo ou disponibilidade ou paz de espírito para se aperceberem destas ínfimas evoluções. Outras vezes, lá conseguem descortiná-las. Este fim-de-semana, a Maria juntou mais uma peça. E os pais também. Ela aprendeu a bater palminhas, acompanhadas de um sorriso gigante e um som gutural. Nós aprendemos a imitá-la. A Maria-lego está cada vez mais menina crescida. Os pais estão cada vez mais macacos de imitação.
Já estamos em pulgas para saber o que é que vamos ter de aprender a imitar no próximo fim-de-semana!

sexta-feira, 3 de julho de 2009

CRIANCICE PATENTEADA #1:
A CRIANÇA NÃO CABE NA MALA


Preâmbulo: porque as sextas-feiras são especiais, este blogue vai passar a ter uma Happy Hour à tarde para comemorar o fim de semana que se avizinha. Começamos com a rubrica "criancice patenteada". Por enquanto não vamos colocar os links onde podem adquirir os produtos em causa como medida de salvaguarda dos vossos filhos. Quem quiser contribuir com ideias para esta secção, basta procurar e utilizar a caixa de sugestões ali na coluna direita. Vamos lá então à primeira criancice...


Problema: Incapacidade de levar a criança pela mão e carregar a mala de viagem ao mesmo tempo.
Solução: Sistema que transforma a mala num transportador de crianças.
Curiosidade: Produto desenvolvido por uma assistente de bordo.
Slogan: “Viajar em família tornou-se mais fácil!”
Efeito colateral: Criança pode ser confundida com a bagagem e ir parar ao porão do avião.

EQUILÍBRIO DA ESPÉCIE


Apesar de nas últimas décadas andar-se a defender que somos todos iguais, a verdade é que continuam a existir diferenças entre homens e mulheres. A forma como os dois sexos lidam com as crianças não é excepção. Analisemos o assunto recorrendo a generalizações (e a excepção será conotada como a confirmação da regra).
De um lado temos as mães. Elas encaram os seus bebés como uma extensão do próprio ser. Afinal, andaram a carregar o bebé durante uma data de meses, enquanto se concretizava o apelidado “milagre da vida”. Por isso, a mãe tem uma inclinação natural para criar dos filhos. Eles são sempre a prioridade, que nem tem de ser equacionada ou pensada.
Do outro lado temos os pais. Eles também encaram os seus bebés como uma extensão do próprio ser. A diferença é que andaram a carregar a mãe, ainda mais pesada do que o habitual por causa do bebé, durante uma data de meses. Logo aqui, já têm razões para ficarem mais cansados. Também lhes ocorre um “milagre da vida” na barriga, mas é mais duradouro e constante (o estômago cresce ao longo dos anos, fruto de combinações complexas de cenas bebíveis e comestíveis). Por isso, têm inclinação natural (e altruísta!) para deixar a mãe criar os filhos. Para os pais, a prole é sempre secundária, algo que nem tem de ser equacionado ou pensado.
Exemplifiquemos com a prática. Quando acorda, ou chega a casa, ou vai buscar a criança/bebé à escola, o que faz a mãe? O instinto impele-a para ver se a criança está com fome ou está asseada ou está qualquer coisa. O homem chega a casa, ou acorda, e o que faz? O instinto impele-o para ver se o computador está a funcionar bem ou se a televisão não avariou.
Ultimamente, surgem notícias de casais que estão a alterar esta ordem natural das coisas. Sabe-se de pais que não actualizam blogues por colocarem o bebé como prioridade. Não faço ideia do resultado que isto poderá ter no equilíbrio da espécie humana. Mas vai ter. Já estou a ver os papás a terem de parar o que estão a fazer no computador para terem de acorrer ao choro das crianças. É que a mamã pode bem estar ocupada a tentar perceber como funciona o objecto mais misterioso para qualquer mulher: o comando da televisão.
Tsccc, tscccc, tsccccc. Dou por mim a concordar com os velhotes do autocarro: “Aaah! No meu tempo é que era!”

quinta-feira, 2 de julho de 2009

OITO MESES, CINCO COISAS

A Maria cumpriu durante esta semana os primeiros oito meses de vida. Neste momento, estas são as cinco coisas nela de que mais gosto.

1 – O sorriso aberto quando vê o papá chegar [ao pé da cama dela, ou vindo da rua, ou ao berçário para a buscar].
2 – Os pés, com as pontas dos dedos curvadas para baixo, num arco de bailarina.
3 - O ar superior ou de desinteresse [alguém o rotulou de “olhar de viés”] que coloca para mostrar quando estamos a mais ou simplesmente que não está para aí virada naquele momento.
4 – A mão a agarrar o meu dedo, enquanto bebe esparramada no meu colo o biberão de leite.
5 – As gargalhadas puras que concede perante certas brincadeiras que lhe faço, como o tapar da cara dela com uma fronha, dizer "não há Maria", e ela risonha tirar a fronha à espera do "tá aquiiiiiiiiiii!".

quarta-feira, 1 de julho de 2009

PERIGOS ESCONDIDOS

Quatro mães e seis crianças – duas de colo – passeiam num recinto desportivo ao ar livre. Ali não há carros. As pistas existentes são para correr ou caminhar em redor de quadras de ténis, campos de futebol, pavilhões gimno-desportivos. Proliferam os eucaliptos e pinheiros que providenciam sombras. A tarde está quente e agradável. Há bebedouros de água para aplacar a sede. Apetece de facto dar uma corrida para brindar ao bom tempo. As crianças mais crescidas desatam a saltitar entre o caminho asfaltado e a terra cheia de folhas secas.

- Henrique, venha já para o pé da mãe!! – diz uma aflita.
- Gonçalo, não te afastes! Vem para aqui! – grita outra, também aflita.

Um dos miúdos pára, temeroso, e começa a chamar pelos restantes que continuam a afastar-se. Duas mães aprestam-se a apanhar e segurar as outras crianças.

- Estão a ver?! É por isto que eu não venho mais vezes para aqui!!! - conclui uma mãe olhando para as outras, desesperada porque o filho se afastara momentaneamente dois metros dela. E já com a cria debaixo da guarda, avisa-a: - É aqui que quero que vás! Ao meu lado! Sem sair daí!

Apetece de facto correr para celebrar a alegria de uma tarde belíssima. Ali não há carros. Mas há terra, bebedouros, árvores, até mesmo um parque infantil... Deve ser por isso que é perigoso andar por lá. Apresso o passo. Vou mas é regressar às vias cheias de automóveis a alta velocidade e ruídos citadinos. Pfiiuuuu, acho que escapei por pouco!