terça-feira, 13 de outubro de 2009

PUZZLE GENÉTICO


Quase acabadinho de nascer, com cerca de meio metro, olhos fechados, corpo e expressão frágil, e já cada bebé começa logo a ser retalhado pelas famílias do pai e da mãe. Chegam uns e sentenciam que “tem os olhos da mãe”. Vêm outros e reconhecem logo “o queixo e as orelhas do pai”. Rapidamente, todas as partes do bebé vão sendo tomadas, uma a uma, pelas duas facções beligerantes. Parece o jogo do Risco, com árduas batalhas pelo território do recém-chegado. “A cara redonda da mãe? Ai não, nem pensar, ela é toda pai!”. “O quê? O nariz do pai? Longe disso, felizmente, coitadinha da menina! É nariz cem por cento mamã!”

Assistimos calados a estas movimentações no tabuleiro de pertenças deste e daquele lado. Quando nos perguntavam a opinião, dizíamos que a Maria era parecida com… a Maria. Claro que na intimidade lá fomos reconhecendo esta ou aquela feição, esta ou aquela expressão, mas sem dar demasiada importância ao puzzle genético. Ainda assim, confesso que resisti algum tempo à possibilidade, entretanto confirmada, de a Maria ter o cabelo aloirado. Ou melhor, castanho-claro como o papá diz.

Melhor ainda fez uma bisavó paterna. Mal viu a Maria, apressou-se a proclamar a sentença: “Ah, ela não tem nada de pai.” E lá encontrou semelhanças com vários elementos da parte familiar maternal. Subitamente com dúvidas sobre a efectiva paternidade da criança, ainda perguntei “Ó avó, mas não há nem uma coisinha parecida comigo?”. Mais valia ter estado calado, perante a resposta categórica: “Ai, é que nada mesmo. NADA.” Suspiro. Até neste Risco-Bebé há alianças que surgem do sítio mais inesperado.

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