quinta-feira, 3 de setembro de 2009
PAI-CÁBULA
Já passou a metade da semana em que estou (mais) responsável pela Maria. Com a escolinha fechada e a mãe de regreso ao trabalho, a coitada não teve outra possibilidade senão passar uns dias intensos só com o papá. Quando escrevo estas linhas, já lá vão dez refeições, talvez o dobro de fraldas, e o triplo ou quádruplo de vezes em que apanhei a fronha de dormir/descansar do chão.
A Maria serenou com a perspectiva de ser tratada por mim quando viu as cábulas deixadas pela mãe. Uma folhinha inteira, frente e verso, com as rotinas diárias, mais uma pequena com o menu do dia e ainda um post-it com lembranças de última hora. Com as fraldas, os cremes, as roupas razoavelmente controladas, dediquei maior atenção à preparação das refeições. Li tudo como quando vejo uma receita, assim na diagonal, na expectativa de decorar os passos de forma automática. Mas como não é raro terminar os cozinhados e lembrar-me “ups, faltou o sal!”, no segundo dia li as directrizes alimentares com mais cuidado.
Tenho a vida facilitada, confesso. O leite matinal é rotina já de longa data. Ao almoço, a sopa está feita e é só preciso aquecer, juntar um pedaço de carne triturada, de peixe desfiado, de gema de ovo cortada. Migar uma banana ou descascar e triturar um pêssego, uma maçã ou uma meloa. Ou cortar uma manga ou uma papaia e fazer “sumo”. O lanche varia entre leite, iogurte com o resto da fruta e bolacha partida, ou papa. Ao jantar, o turno da mãe já está de serviço à filha.
Entre as refeições, há tempo para verificar as evoluções da Maria. Sentada no hall, hesita em colocar-se na posição de gatinhar. Fica ali presa no último momento, no impulso decisivo que ainda falta, nesse salto de coragem e de fé que a colocará de mãos no chão, depois de aterrar de cabeça umas quantas vezes. Nesse impasse, gera-se o desconforto. Surge o pedido de auxílio para que a coloquem na posição inicial. Sento-a. E ela descobre que consegue movimentar-se, mesmo sentada. De marcha-atrás em busca do brinquedo longínquo. E sem precisar de cábulas, como o pai precisou.
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