quarta-feira, 23 de setembro de 2009

QUANDO O DESPERTADOR TOCA


Estar de serviço à Maria implica, ao contrário do que poderia pensar, acordar com despertador. Ou é ela que me acorda (tem sido raro), ou é a Radar. Escapo-me para a cozinha sempre a tempo de evitar ouvir o tenebroso jingle da “K7 de Verão” do Zé Pedro. Aqueço uma chávena de café enquanto meço a água do biberão matinal. Sorvo a bebida negra vagarosamente à espera do efeito pretendido. O apito do aquecedor de biberões encarrega-se de terminar o processo do despertar. Preparo o leite e rumo ao quarto. Ajeito as almofadas, levanto um pouco do estore, coloco o biberão a postos.
Ultimamente a Maria tem um acordar VIP. Entro no quarto obscurecido. Geralmente ela já está de olhos abertos. Sorri em resposta ao “Bom dia Maria! Olá filha! Bom dia alegria!”. E logo aqui não me reconheço, mesmo sob efeito do café. Diacho, mas eu não era um tipo noctívago, com péssimo acordar matinal? O quê? Alguém me está a dizer que… ah, sim? Pelos vistos, afinal continuo a ser uma bestinha para os restantes seres humanos. Regressemos por isso à sortuda Maria que já está a apreciar o ilusionismo do pai, um truque baixíssimo para subir na consideração dela (“Vamos fazer magia? O papá vai fazer luz!”, enquanto abro o estore).
Braços estendidos, bebé levantado, saudamos o quadro dos gatinhos antes de ir para o quarto de aleitamento. Diz-se bom dia ao Senhor Gardel (o Carlos) da parede antes de posicionarmo-nos na cama. A Maria nem tem tempo de refilar com fome. Vuoshhhhhh!!! Biberão acoplado em posição de esvaziamento. Quando o nariz não está entupido, é empreitada de um fôlego só. Após a sucção, esperamos pelo arroto acompanhados pelas ondas radiofónicas. Às vezes balançamos o corpo e agitamos os braços. Contamos os minutos preciosos em que podemos ficar neste estado de tudo e de nada, antes de regressarmos ao resto das tarefas matinais. O Senhor Gardel torce o nariz aos sons emitidos pelo rádio-despertador. Faço-lhe a vontade e silencio a música. Lá fora o sol (ainda) chama por nós.

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